Saturday, March 8, 2008

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Eram a imagem dos Loucos Anos 20-30. Les garçonnes, cabelos curtos em linha recta, silhueta esguia, algo andrógina, hesitante entre o masculino ou uma nova feminilidade, rosto da emancipação e liberalização femininas. As saias vão encurtando, em 1924 sobem a 26cm do chão, no ano seguinte a 30 ou 35, mas a garçonne traz a excentricidade. O vestuário enriquece de pedrarias e outras bijutarias, os braços despidos exibem numerosas pulseiras. É o feminino, a dizer-se. Ao mesmo tempo, o pescoço nu valoriza os grandes brincos, é com Louise Brooks que o corte à la garçonne se torna lenda, sendo o cinema o veículo da sua divulgação.
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As duas grandes guerras vêm diluir as diferenças entre homem e mulher pois, na ausência destes, são elas quem tem de tomar as rédeas do país e desempenhar trabalhos que antes lhes estavam interditos. Munitionettes, cheminottes, obusières, fabricam munições, conduzem táxis, autocarros, cobram bilhetes, trabalham em fábricas, são polícias. E têm, ainda, um fundamental papel na Resistência Francesa. Escrevendo, pintando, mesmo as actividades clássicas, como a costura, tornam-se uma profissão remunerada. Ousando.
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O seu envolvimento nas grandes guerras levou-lhes uma liberdade no estar e nos comportamentos nunca antes vista. Simultaneamente, introduziu mudanças no vestuário vulgarizando o uso das calças, aligeirando os vestidos, que se queriam práticos dadas as actividades laborais.
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A garçonne não apenas usa cabelo curto, veste calças e pratica desporto, imagem que, desde a última década de oitocentos, se alia ao masculino. As calças, já antes usadas em traje de equitação, calça ou prática de golfe, vêm para ficar no vestuário do quotidiano, vontade de imitar os homens na sua liberdade, acesso para a igualdade.
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Sendo a calça a peça de vestuário que diz da virilidade masculina, poderá considerar-se que esta busca de igualdade assenta, numa primeira fase, na negação da feminilidade, dada a vontade expressa de imitar os homens. E, porque o vestuário, traço cultural determinante do sexo, aponta um lugar na vida social, numa sociedade onde o poder é masculino, adoptar a forma de vestir do homem torna-se uma afronta.
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As mulheres russas conseguiram o voto em 1917, as inglesas em 1918, seguiram-se as luxemburguesas no ano seguinte, e as americanas em 1920. As turcas obtêm-no em 1930, e as espanholas em 31. Embora a Revolução Francesa lutasse pela igualdade, nela se envolvendo as mulheres, por ele lutando desde 1791, o nascer livre e com iguais direitos aos dos homens levou Olympe de Gouge à guilhotina, e o sufrágio universal, após a Revolução de 1848, atendeu apenas metade da população, a metade masculina. As sufragistas, empenhadas em apelos públicos, numa intensa campanha após 1900, apenas em 21 de Abril de 1944, conseguem o direito ao voto, com de Gaulle.
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Sendo o homem o chefe do clã, era este quem pela família deveria votar. As mulheres, destinadas por natureza e vocação a serem mães, deveriam ser guardiãs da família e seus valores, não mais. Porém, o destino feminino deixa de ser apenas esposa, mãe, dona de casa apontando outros caminhos, as mulheres investem em interesses que não apenas o lar ou a costura, vão-se destacando em outros domínios, conquistam um lugar no campo artístico.
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Renée Vivien e Anna de Noailles escrevem poesia, Isadora Duncan deslumbra com a sua dança, Mistinguett cativa Paris, tornando-se a vedeta mais popular dos Folies Bergère, Moulin Rouge e Eldorado. Louise Brooks brilha no cinema, Alice Guy é pioneira como operadora de filmagens, Camille Claudel realiza as primeiras esculturas, Lili Boulanger, é célebre compositora, Suzanne Valadon faz do seu estúdio o Musée de Montmartre, Elise Laroche torna-se a primeira mulher no mundo a obter a licença de pilotagem. Mulheres corajosas que, enfrentando a sociedade, triunfaram sobre as falsas morais e o preconceito, tornaram-se senhoras da sua própria vida, a elas se devendo o grande passo para a modernidade.
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6 comments:

Anonymous said...

Há muitos dias.
A mais.

Dia da Árvore, do Livro, da Música, da Criança, dos Avós, etc.
De "Contra" mil e uma doenças.
E o da Mulher.

Nunca percebi porquê.
Não há árvores, livros, música, crianças e avós todos os dias?
Mil e uma doenças?
Mulheres?

E tios? primas? pastelarias? oficinas de automóveis?

Eu sei.
Serei já acusado de ignorante, machista e outros epítetos a que me vou habituando em cada um destes "dias".

Paciência.

Amanhã é dia de quê?


Eu sébio

teresamaremar said...

Subscrevo. Dias da diferença.
E acrescento, o Dia da Mulher mais não é que uma manobra machista, pretendendo conceder à Mulher tão somente... um dia

travão à igualdade :)))

fórmula de pendor feminista esta minha, também alguns dirão... :)

náufrago do tempo e lugar said...

Os anos de ouro do modernismo que se seguiram aos auríferos anos - passe a cacofonia - da “Belle Époque”, que deixou à modernidade grandes desenvolvimentos na ciência (inventos como o telefone, o automóvel e o avião), bem como na literatura, nas artes visuais, etc.


A propósito do voto da mulher portuguesa, li algures que uma portuguesa (médica) votou em 1911 para a Assembleia Constituinte. Deve ter sido alucinação dos sentidos. :)


A talhe de foice, deixo aqui parte de um comentário que fiz num fórum, aquando de uma acalorada discussão relativa ao referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez (Portugal).
Terminava assim:
“E sabes o que me interessa mesmo? Que ontem tenham sido desenterrados os milhares de espinhos aguçados cravados na pele da MULHER portuguesa, desde os primórdios, e que tenham triunfado:

O SIM, pela Justiça!
O SIM, pela Dignidade!
O SIM, pela Razão!
O SIM, pela Sanidade!
O SIM, pela Liberdade!
O SIM, pela Humanidade!
O SIM, pela MULHER!
"
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Gosto muito do teu texto.

Um abraço.

teresamaremar said...

Incontestavelmente admiro as mulheres desta época, bem mais libertas, lutadoras e determinadas que as de hoje.
Atravessavam continentes, que desbravavam, rasgavam preconceitos, investindo em todas as esferas até aí interditas ou menos indicadas. Abriram todas as portas.

Anonymous said...

Lindissimas fotografias e texto.

Isabel Victor said...

Fabulosas imagens ...
Belíssimo texto !


Estava agora a pensar tb e m George Sand e na portuguesa Olga Morais Sarmento (entre tantas outras, ilustres anónimas ... de todos os tempos, de várias marés!)

Esta semana recebi, o museu um convite para a inauguração, em Almada, de um monumento ao "Marinheiro insubmisso".

Rapidamente pensei ... e as tantas anónimas que não tiveram escolha, eternamente submissas ? E as muitas outras que fizeram os marinheiros felizes ? E aquelas que submeteram os ditos marinheiros ? Dessas não reza a História ...

A história contada por homens ...

:))


iv* a.braço.a